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agronegócio

O homem com água demais

Projeto em implementação

As fazendas Conquista e Sinimbu, que Schettino mantém junto a outros familiares, também ligados à Tegma, ficam em Jaborandi (BA), a 95 km do centro da cidade e a 60 km da sede de Correntina, na mesma região. São, ao todo, 23,6 mil hectares de terra, distribuídos em nove diferentes matrículas, todas contíguas – o que representa uma área maior do que a capital pernambucana, Recife. 

Além de estarem no nome de Fernando Luiz Schettino, as propriedades pertencem a outras sete pessoas: os irmãos Francisco Creso Junqueira Franco Jr., Ana Lúcia Moreira Franco Ballve e Rogério, Mário Sérgio, Augusto César e João Paulo, todos esses com sobrenome “Moreira Franco”, além da mãe deles, Maria Thereza Moreira Franco. Os seis irmãos são filhos de Francisco Creso, com quem Schettino fundou, em 1969, a empresa que hoje se chama Tegma, e sobrinhos do empresário. Um sétimo irmão, Ricardo, já falecido, também aparece como proprietário nos documentos da fazenda.

As fazendas são ligadas também à Iaciaria Agropecuária, cujo nome fantasia é Sinimbu Agropecuária. A empresa tem como sócios os oito donos das propriedades rurais, além de Dilcileia Domingos Franco e a empresa Mac Participações Societárias – ligada a Mário Sérgio e Ana Cláudia Ferraz Franco. Há ainda uma outra empresa agropecuária ligada a Schettino e seus familiares: a Rio Formoso Agropecuária.

As primeiras outorgas para captação de água ligadas à família de Schettino datam de, no mínimo, junho de 2008 – como o acervo disponível do Diário Oficial da Bahia começa em julho de 2007, não é possível verificar se há outorgas anteriores. À época, o antigo Instituto de Gestão das Águas e Clima (Ingá) concedeu autorizações de captação de água para seis membros da família, incluindo Schettino, com valores entre 53,7 e 70,1 milhões de litros por dia. Somadas, as outorgas chegavam a quase 377 milhões de litros, que poderiam ser captados do rio Pratudão, afluente do rio Formoso, na bacia do rio Corrente. Nos anos seguintes, as autorizações continuaram diluídas entre os familiares, até que, em 2019, passaram a ser centralizadas em Fernando Luiz Schettino.

A despeito da vasta quantidade outorgada e de terem autorização para captar recursos hídricos há pelo menos 13 anos, Schettino e sua família ainda não usufruíram de toda a água concedida pelo Estado. Os mais de 26 mil hectares da família não têm atualmente produção agrícola consolidada, já que o projeto consta como em andamento, de acordo com os registros oficiais. Segundo documentos ligados às fazendas, acessíveis no Sistema Estadual de Informações Ambientais e de Recursos Hídricos (Seia) da Bahia, são cerca de 15,7 mil hectares agricultáveis, sendo aproximadamente 10 mil de agricultura irrigada e o restante em regime de sequeiro – que utiliza apenas a água das chuvas. O objetivo da família é produzir especialmente soja, algodão, milho e feijão.

Na Bahia, o Cerrado é o bioma predominante e o agronegócio, a atividade dominante

Autorização para desmate

Em agosto deste ano, Schettino recebeu do Inema autorização para desmatar 2.998 hectares nas fazendas Sinimbu I, II, III, IV, V e VI e nas fazendas Conquista I e II. Em setembro, ele solicitou autorização para “atos florestais”, envolvendo a queimada de área equivalente, procedimento que ainda está sob análise. Nesses quase 3 mil hectares, ele pretende implementar agricultura de sequeiro, o que significa que, ao menos por enquanto, os mais de 466 milhões de litros autorizados não serão utilizados.

Na justificativa dos projetos apresentados ao Inema, o empresário destaca o baixo IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) de Jaborandi e apresenta “medidas compensatórias” dos impactos negativos das atividades. Entre elas está a contratação de mão de obra local, com a realização de capacitação profissional da comunidade. Para justificar ambientalmente a opção pela irrigação, nos processos relacionados às outorgas, é apontado que o modelo permite “a utilização de áreas de menor extensão territorial para se obter maiores produções”.

Maior outorgado individual, Schettino não faz parte da Associação de Agricultores e Irrigantes da Bahia (Aiba), que reúne muitos dos privilegiados com outorgas de água no Cerrado baiano

Schettino já foi investigado por formação de quadrilha e cartel

Em 1971, o carro da moda era o Opala, da Chevrolet, marca utilizada pela gigante General Motors no Brasil. Uma das empresas responsáveis por transportar os veículos da fábrica da montadora, em São Caetano do Sul (SP), para o Rio de Janeiro e Niterói, era a Transportadora Sinimbu, fundada apenas dois anos antes, no bairro carioca de São Cristóvão. 

Os sócios, Fernando Schettino e Francisco Creso, com 23 e 40 anos à época, respectivamente, iniciaram o empreendimento focando no transporte de carnes, mas, logo no início dos anos 1970, passaram a direcionar as atenções para os veículos. O Opala deixou de ser produzido em 1992, muita coisa mudou na indústria automotiva, mas a Sinimbu seguiu crescendo, se consolidando como uma das maiores empresas de logística do país. 

Em 1998, passou a ser Axis Sinimbu, após fusão com outros negócios do mesmo ramo, e quatro anos depois se transformou na Tegma, nome que utiliza atualmente. Em 2007, a Tegma fez novas aquisições e passou a negociar ações na Bolsa de Valores de São Paulo.

Atualmente, 48,5% das ações da Tegma estão em circulação, listadas na Bolsa, enquanto três grupos principais controlam 50,6% das demais ações. A Tegma tem mais de 1,7 mil funcionários, distribuídos em 11 estados. Em 2020, ano em que a pandemia prejudicou os resultados financeiros dos negócios ligados ao ramo automotivo, a empresa teve receita bruta de R$ 1,3 bilhão, com lucro líquido de R$ 74 milhões.

Por mais de 15 anos, Schettino e outros executivos do Grupo Tegma enfrentaram processo por formação de quartel e de quadrilha no setor de transporte de veículos, junto com ex-presidentes de associações de classe e executivos do Grupo Sada – incluindo seu dono, o atual prefeito de Betim (MG), Vittorio Medioli (PSD). Segundo o site Livre Concorrência, especializado no tema, o processo já passou por três estados e duas esferas, mas ainda não foi concluído. O site chegou a ser processado por Schettino, que perdeu a ação.

De acordo com a denúncia que está atualmente sob análise, feita pelo Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) de São Bernardo do Campo (SP), os acusados, “de forma habitual e em contexto  de  organização  criminosa,  em  comunhão  de  esforços  e  unidade de desígnios,  abusaram  do  poder  econômico,  dominando  o  mercado  de  serviço  de transporte  rodoviário  de  veículos  novos,  eliminando  total  ou  parcialmente  a concorrência  mediante  o  ajuste  ou  acordo  de  empresas”. A atual denúncia foi apresentada em julho de 2013 e aceita no mesmo mês.

Na mais recente decisão disponível sobre o processo, a juíza responsável determinou a extinção da punibilidade de vários dos réus, incluindo Fernando Schettino e Vittorio Medioli. A medida deve-se à prescrição da pretensão punitiva, por conta da idade avançada dos executivos.

Além da Tegma e todas as empresas sob seu guarda-chuva, Schettino e seus familiares também têm outros tentáculos no setor de logística e automotivo, entre outros. Mário Sérgio Moreira Franco é fundador e o principal acionista do Grupo Itavema, um dos maiores revendedores de veículos do país. Uma das empresas que fazem parte da Itavema é a Dafra Motos, fabricante brasileira de motocicletas com sede na Zona Franca de Manaus (AM), também controlada pela família. Além da própria Itavema, Schettino já esteve associado a empresas como a Mandarim e a Autman, de locação de veículos, e a Sinimplast, de embalagens plásticas.

Procurado, a secretária de Schettino informou que ele estava em viagem e que encaminharia os questionamentos da Pública. Até a publicação, no entanto, eles não foram respondidos.

Fonte: Publica

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