A conversa foi puxada por uma fala de Anderson em 2016: “Quando eu vejo jornalistas se envolvendo profundamente com alguma coisa, sem nenhuma perspectiva de renda e de carreira, isso é fascinante, isso é jornalismo, esse é o caminho. Nunca houve uma época boa para ser jornalista, talvez agora seja a pior, as montanhas estão desabando, mas ao mesmo tempo coisas novas estão nascendo”. Seis anos depois, ele considera que os horizontes se ampliam à medida que a circulação de informações se torna mais instantânea, com a internet, mas que a essência e os desafios de ser jornalista permanecem os mesmos.
Anderson disse que já passou por momentos pessimistas com relação às mudanças trazidas pelas ferramentas digitais, mas que, com o tempo, percebeu que a linguagem ainda é a chave do jornalismo, mesmo que os meios de distribuição mudem. “Você ainda precisa dominar a arte de contar histórias”, resumiu. “Os jornalistas ainda precisam saber quais são as suas ideias, seus pontos fortes e encontrar formas de fazer com que o público se interesse pelo que fazem. Nesse sentido, sempre voltamos à essência, ao básico do jornalismo”, concluiu.
Quanto às mudanças positivas, Natalia ressaltou a possibilidade de experimentação e de uso de uma quantidade enorme de ferramentas. “Reconhecendo essas mudanças e reconhecendo que essas mudanças da revolução digital impactam não só o jornalismo, mas também a própria comunicação, a própria política e a própria guerra, a gente está num momento muito interessante para discutir [isso tudo]”, disse a presidente da Ajor.
Anderson, que já cobriu algumas guerras, lembrou que “todos os conflitos tiveram alguma tecnologia nova”, mas que a técnica da reportagem sempre é o elemento que define o jornalismo. Ele também lamentou a superficialidade de alguns vídeos que viu sobre a guerra da Ucrânia no TikTok: “Não basta estar em um lugar, tirar fotos, fazer vídeos e mandar para seus amigos. Qualquer um pode fazer isso.” Se estivesse cobrindo a guerra na Ucrânia usando o TikTok, Anderson diz que usaria os vídeos curtos para tentar, aos poucos, levar as pessoas para a realidade dos ucranianos.
Para ele, mesmo se uma resolução para essa guerra for encontrada em breve, o mundo já não será mais o mesmo de um mês atrás – “será um lugar pior, e continuaremos à beira de novos possíveis conflitos” -, a menos que os líderes mundiais encontrem maneiras de desescalar as tensões. Anderson também destacou o poder da propaganda política na Rússia, capaz de fazer com que muitos cidadãos – mesmo em uma era de tanto acesso à informação – nem acreditem que esteja ocorrendo uma invasão na Ucrânia.
Mas ele ressaltou que essa não é uma realidade apenas da Rússia: o jornalista relembrou a desinformação nos Estados Unidos após a derrota de Donald Trump nas eleições e a invasão do Capitólio. Além de ainda questionar os resultados, muitos republicanos e apoiadores do ex-presidente ainda hoje negam a gravidade ou até a existência do ocorrido de 6 de janeiro de 2021.
De olho nas eleições brasileiras, Natalia Viana perguntou o que podemos aprender com as eleições americanas de 2020. “Trump negou a vitória de Biden, enfraqueceu o sistema e levou à invasão do Capitólio”. Para ele, por mais que haja investigações e processos sobre o caso, há uma percepção pública de enfraquecimento da democracia. “O Brasil passa por uma situação semelhante com Bolsonaro, e estamos preocupados que ele possa tentar fazer como Trump.”
Anderson recomendou que, durante a campanha eleitoral, o jornalismo brasileiro olhe para grupos que sustentam o bolsonarismo, como os militares e a polícia, “que parece ter sido instrumentalizada por Bolsonaro”. Para Natalia Viana, tanto Bolsonaro quanto Trump se alimentam de forças que precisam ser mais investigadas.
O Festival 3i segue com programação totalmente online e gratuita até o dia 25 de março. As inscrições são gratuitas e podem ser realizadas pelo site do festival, onde também é possível consultar toda a programação e assistir às atividades já realizadas.
Fonte: Publica