O coronel Fregapani se autodefine como nacionalista, conservador e liberal, perfil que se encaixa como luva às pretensões do presidente Jair Bolsonaro nas questões centrais da Amazônia pelo atual governo: mineração em terra indígena, legalização fundiária e exploração dos recursos naturais como eixos de ocupação dos vazios demográficos da região, estratégia que, como se sabe, colocaram o Brasil como o país do desmatamento, da grilagem de terra e da invasão permanente de terras indígenas por garimpeiros.
No texto, Fregapani levanta uma teoria esquisita, segundo a qual, Bolsonaro torna-se vítima da esquerda e de ex-aliados como os ex-ministros Moro e Luiz Henrique Mandetta (Saúde), que ele chama de “trânsfugas”. Seu foco, no entanto, são os comunistas, sobre os quais diz que “acreditava-se que com a derrota eleitoral de 2018 haviam aderido às teorias de Gramsci [filósofo marxista Antonio Gramsci] e desistido da luta armada”. Mas sustenta que com a fuga de aliados e o STF “legislando e provocando propositalmente o caos jurídico e administrativo esperando uma reação enérgica para acusar o presidente de estar dando golpe contra a democracia”, a “esquerda ideológica se fortaleceu” e tudo se transformou num complô para tirar o presidente do cargo.
Como se Bolsonaro tivesse sido o sabotado e não o sabotador, o ápice da teoria da conspiração vem na análise que o militar faz da pandemia: “Para piorar ainda veio a epidemia (sic) do coronavírus em auxílio dos opositores, que a aproveitaram não se importando com as mortes que causavam nem com a quebra da economia. Nisto foram muito bem sucedidos, instilando medo na população e atribuindo a culpa das mortes ao Executivo, de mãos atadas pelo STF”, escreve.
Para Fregapani o desmanche do esquema político que amparava Bolsonaro e as fissuras na opinião pública foram aproveitados pelos opositores. Ele baseia sua tese de guerra civil também em uma declaração atribuída ao ex-ministro José Dirceu favorável à tomada do poder pela força. “Ele não enfrentaria o Exército em campo raso. A proposta dele [Dirceu] está numa convulsão social, provocada pelo caos completo, onde haverá greves, banditismo e os saques generalizados. Então farão ataques e saques simultâneos que as forças estaduais e municipais não conseguirão coibir, e a população já apavorada pelo Coronavírus, acostumada a se acovardar, acatará as imposições. Na verdade, já estamos no início da guerra”, pontua o militar, invertendo, mais uma vez, a realidade dos fatos. Segundo ele, cerca de 35 mil presos libertados pelo Judiciário no governo Bolsonaro, reforçariam os objetivos da esquerda para “forçar o Exército a agir em missões antipáticas contra massas famintas, perdendo a força o prestígio que ainda conserva”.
Ele levanta a hipótese de que, em outra frente, o STF ainda tentará afastar Bolsonaro anulando as eleições de 2018 sob a alegação de uso de fake news na campanha, o que, na opinião dele, justificaria a posse do ministro Roberto Barroso na presidência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). “Tudo faz parte de um plano, de um grande acordão para sabotar o governo em plena pandemia. A verdade é esta, e só não enxerga quem não quer ver. Está evidente que as forças reativas da facção esquerdista/globalista acreditam que suas medidas pseudo legais consigam neutralizar o Exército e esperam só ter que enfrentar os nacionalistas de dentro e de fora do Exército, mas mesmo assim nós dispomos de uma motivação superior: somos milhões dispostos a lutar até a morte pelo nosso país, enquanto os que querem apenas tomar os bens dos outros podem até matar, mas dificilmente estarão dispostos a se sacrificarem por isto”. Ele fecha o texto com o bordão bolsonarista: “É claro que não queremos uma guerra civil, mas se houver, lutaremos. Não será em nome de ideologias, mas em nome de “Deus e da Pátria”. Procurado pela Pública, o coronel não quis falar.
A delirante tese de Gélio Fregapani tem embalado sonhos e estimulado a verve belicista dos bolsonaristas. Mas nenhum deles se empolgou tanto como o presidente do PTB, o ex-deputado Roberto Jefferson, condenado por corrupção no mensalão, que distribuiu nas redes sociais um vídeo em que aparece vestido de justiceiro e armado com duas pistolas – uma num coldre atravessado no peito e outra na cintura, exortando correligionários à luta contra o “gayzismo” e o “comunismo” em nome de “Deus, pátria, família, vida e liberdade”. O culto ao ódio e ao conflito, como se vê, flerta com o ridículo.
Fonte: Publica