Segundo dados do projeto Amazônia Minada, que monitora requerimentos de mineração em áreas protegidas da região, pouco mais de um terço (34,3%) do território Yanomami está coberto por requerimentos para extração mineral – uma área superior à da Bélgica. “O garimpo quando entra na comunidade, costumo dizer que é só a ponta do iceberg”, afirma o pesquisador da Fiocruz Paulo Basta.
“A primeira providência [do garimpo] é promover uma devastação completa na floresta, derrubar árvores, afugentar todas as espécies nativas, da fauna, da flora, promovendo uma alteração do ecossistema local, o que muda a população de mosquitos, provocando casos de malária. Surtos de malária estão diretamente associadas com o garimpo”, explica. Segundo o pesquisador, que já publicou outros artigos sobre o tema, muitos dos casos de desnutrição infantil na TI Yanomami estão associados a episódios recorrentes de malária entre as crianças, o que gera queda no estado nutricional de difícil reversão.
“Nós estamos sofrendo uma invasão dos garimpeiros na TI Yanomami”, afirma Júnior Hekurari. “Sujando água, levando vários tipos de doenças nas comunidades. Onde não existia a malária, tá existindo, porque através de garimpeiros, de água suja, contaminando, levando essas doenças, a malária chegou. A malária falciparum [forma mais grave da doença], que não existia há dois, três anos atrás”, conta.
A “água suja” que Júnior Hekurari menciona é especialmente contaminada por mercúrio, utilizado na separação do ouro dos demais sedimentos. Um estudo de 2016 revelou que algumas aldeias chegavam a ter 92% de seus habitantes contaminados por mercúrio, o que inclui crianças menores de 5 anos. A contaminação afeta também os peixes, que são base de alimentação de algumas comunidades. Em Maturacá, na parte amazonense da TI Yanomami, um estudo semelhante, feito em 2019, constatou a presença de mercúrio em 56% das mulheres e crianças da região.
Contaminados repetidamente pela malária, pelo mercúrio e também por outras doenças, os pais e as mães Yanomami ficam muitas vezes impossibilitados de caçar, semear seus roçados ou de coletar alimentos. Como não há energia elétrica nem a possibilidade de armazenar alimentos por períodos longos, a incapacidade de buscar alimentos por conta de doenças infectocontagiosas é fator relevante no cenário da desnutrição infantil no território.
Fonte: Publica